sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Matei um homem em Reno, só para vê-lo morrer


É manhã de sol em Paris. Saio por aí, vagando sem rumo, na direção da Place de la Concorde e depois seguindo adiante. Ando até perder tudo de vista. Volto pelo outro lado da rua, acompanhando as margens do Jardin des Tuileries. Já que estou à toa mesmo, resolvo entrar no jardim. O sol não se avizinha por entre as árvores. O ar é fresco e sombreado. A luz não queima; ilumina. Alguns corvos pousam pelo chão e gralham sem parar. Um homem velho, empuleirado sobre um banco.

Sento no banco ao lado e ligo meu MP4.

Coloco Johnny Cash para tocar.

Eis Paris me contornando... e Folsom Prison Blues nos meus ouvidos.

Quando eu era pequeno, minha mãe disse "filho, não se meta com armas". Mas eu matei um homem em Reno só para vê-lo morrer...

Após Folsom Prison, vem Get Rhythm e depois Big River e depois Cocaine Blues e depois Hurt. Música após música e Paris após Paris. Cash canta como se alguém estivesse rasgando a sua alma em dois, fazendo-a sangrar.

Faz uma hora que estou sentado num banco solitário do Jardin des Tuileries. Os carros zunem às minhas costas. Os corvos gralham e alçam vôo. Johnny Cash canta Man in Black. Está cantando sobre si mesmo, o homem de preto. Ele só se apresentava de preto, como se estivesse indo a um funeral. Segurava o violão (ou a guitarra) como se empunhasse um rifle. A voz firme, dura, forte. O olhar alvejando o público.

É ao mesmo tempo estranho e interessante ouvir Johnny Cash bem no meio de Paris.

Não conheço muita gente que escuta Johnny Cash. Pra falar a verdade, não conheço ninguém que escuta Johnny Cash. Quer dizer, excetuando os conhecidos virtuais orkutianos; nesse caso, encontra-se de tudo. Mas também não faço questão de conhecer.

O sol do meio-dia começa a se impor, vegetação adentro. Cash canta Understand Your Man com a voz grave. E depois manda Chicken in Black, a paródia que fez de si mesmo quando comprou briga com a gravadora.

Essa garotada metida a cool com suas camisetas pretas de boutique, seus cabelos bem cortados e cuidadosamente despenteados, seus casaquinhos listrados e seus cdzinhos indies (sei lá o nome disso...) deviam escutar Johnny Cash. Escutar verdadeiramente, e não porque Cash is Cool. Mas foda-se. É meio-dia, faz sol e Paris continua a ronronar seu Folsom Prison Blues para mim.

Ando na linha.

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